Livro do Centenário do Ministério da Agricultura

OS TEMPOS DIFÍCEIS . 1910-1925 // 30 // 1. O PAÍS “ESSENCIALMENTE AGRÍCOLA” QUE A REPÚBLICA DESCONHECIA A agricultura, naqueles começos da 1.ª República, chama-se cereais. Isto é, naqueles tempos (e também nestes…), o pão (de trigo) era a base da alimentação, sobretudo para uma parte da po- pulação mais numerosa e prolífica e com menos rendimentos e numa época em que o cresci- mento demográfico alcançou médias da ordem dos 10% relativamente à população total do país. Tudo isto acontecia principalmente no Norte de Portugal, no Minho e em Trás-os-Montes, mas também no Centro interior, na Guarda e em Castelo Branco, por exemplo. Por outro lado, como o Norte e o Centro de Portugal são mais montanhosos com precipitações pluviométricas relativamente mais elevadas, a agricultura ainda consegue alimentar as popu- lações e produzir um excedente (em géneros e/ou dinheiro) que permite ao minifúndio (explo- rações agrícolas com áreas reduzidas) salvar-se da miséria 63 . Nestas condições (orográficas, cli- máticas, etc.), o crescimento demográfico era pois forte e sobravam braços para as atividades económicas existentes (agricultura, indústria muito artesanal, comércio). Ora, neste “sistema”, a variável de ajustamento é a emigração 64 . Assim, o “sistema”, mal ou bem, foi-se equilibrando, relativamente ao cereal em questão, o trigo, do seguinte modo e a dois níveis: 1. A nível familiar – os filhos, em parte e nas famílias numerosas (como é o caso na agricultura) emigravam, o que permitia manter vários equilíbrios: a continuidade fundiária, nas pequenas explorações; a sobrevivência dos que ficavam. Assim, iam na grande maioria os filhos; ficavam na mesma “escola” as filhas. Depois, estas casavam; e o ciclo repetia-se. 2. A nível do país, e seus governos. Como funcionava então essa válvula de ajustamento que era a emigração? 65 Os emigrantes en- viavam algum dinheiro poupado para os seus familiares e essas remessas, a nível do Estado, ajudavam a equilibrar os défices orçamentais 66 . CAPÍTULO III IN ILLO TEMPORE… (1910-1913) 63. Repare-se que estou a falar em termos gerais. Na realidade, e no terreno, o Minho, por exemplo, é diferente de Trás-os-Montes, e estes das Beiras, etc. 64. Depois da época dos Descobrimentos, não houve período algum da nossa história sem surtos emigratórios. 65. Repare-se que falo, mais uma vez, em termos gerais, e me refiro a uma época em que eram frequentes lutas, revoluções e distúrbios vários, como greves, etc. 66. Que resultavam, pelo menos em grande parte, das revoluções, das guerras, das greves…

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